segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Sutil




É verdade que gosto de muita coisa sim, acho que até mais que a extensão dos meus bolsos braços. Gosto de comida boa, de maquiagem, de conhecer aquele ponto turístico clássico, de roupa nova, de moda. 
Não há como mentir que o excesso é ruim. Não, não é. O terceiro pedaço da pizza, a sobremesa que se repete quando já me digo cheia, só mais uma peça da liquidação...
Exceder é bom, mas também lá no fundinho desponta aquele arrependimento que depois a gente abafa no crédito.

Paradoxalmente ao excesso, a pressa e ao consumismo fútil, o que realmente me prende, me faz gastar horas só olhando e me deixa de fato apaixonada é o detalhe, a sutileza do inusitado.

Gosto de ver quando um pai para na correria do metrô para amarrar o cadarço do filho pequeno, e a forma como a criança se apoia nos ombros dele; gosto como apartamentos são decorados, como cada cantinho é carinhosamente  pensado; gosto de olhar a parte interna das flores, como se tivessem sido pintadas a mão e como o céu muda de cor em dia de chuva; gosto quando um presente vem com cartão, gosto  até mais do cartão do que do próprio presente.

Gosto do cheiro de bolo no forno e do amaciante na roupa limpa sentido dentro de um abraço. Gosto de textos escritos com a alma e como os autores se expressam nas entrelinhas. Gosto de ver como uma árvore seca produz cachos com cores tão vivas no meio da seca do cerrado.

Gosto do hortelã no suco de abacaxi e dos bordados que minha avó faz nas toalhas de rosto. Gosto de como  jardins ficam bonitos iluminados com lâmpadas no chão e como uma joia bijuteria muda o visual.
Gosto do céu laranjado logo depois que o sol se esconde e de fotos que transcendem as emoções do papel, aquele milésimo de segundo que só o fotógrafo viu.

De fato o óbvio está tão evidente que se torna egoísta. Contudo o inusitado está lá.
Na pressa e na monotonia, na rotina e fora dela, perto ou longe. 

Mas pare um pouco, os detalhes são capazes de acalentar o coração.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Sublimação

Não sei quando me deixei levar, o momento em que o tempo virou e depois ficou nublado de vez. Sem previsão de céu claro por longos meses.

Quando tento revirar minhas memórias, tão cheias de convicção, não encontro onde tudo se tornou relativo. O dia que passei a enxergar demais o outro lado, o inverso.

Filtrei ao extremo, a ponto de quase não deixar chegar nada ao coração. Nem mesmo deixar bater a porta. Em meio a tempos de incerteza, só tenho sentido saudade.

Saudade da casa vazia e do quarto em silêncio, enquanto meu coração queimava na Tua presença. Dos louvores que saiam do meu radio, dos CDS antigos tocados incessantemente, sempre que acordava ou voltava da escola. Daquele tempo em que ir pra Tua casa era a programação mais esperada da semana, e consumia todo o meu fim de semana. Sinto falta daquela paz em meio a tanta confusão, daquela certeza que me tomava, quando não havia no que ter certeza; das confissões solitárias e do renascimento após cada entrega, das lágrimas que escorriam pelo toque do Espírito Santo, sem explicação, rolavam e não podiam ser contidas; das orações oferecidas a um amigo, certas de que seriam ouvidas. Saudade daquela fé que me mantinha em pé, mesmo descalça e sem ter em que me sustentar.

Eram horas dedicadas ao silêncio, a uma busca desapressada por respostas que certamente viriam. Estudos feitos minuciosamente sobre Sua palavra e descobertas intrigantes, mas cheias de sentido.

Numa realidade estagnada, numa luta diária para que a candeia não se apague, o relógio não pare e a fé não morra, eu encontro muitos da mesma forma, que ainda tem forças e se agarram ao último fio que ainda não arrebentou. Enxergam as fibras cedendo, incertos, com medo, mas firmes até que venha o socorro.

E lá no fundo, no quarto mais íntimo desse coração, abafada por muitos obstáculos, há uma voz que grita...

o meu socorro vem do Senhor.